De Alberto Caieiro, "em Pessoa":

"Pensar incomoda como andar na chuva
Quando o vento cresce e parece que chove mais"

14/01/2010

(POR QUE É QUE) QUEM É CONTRA O PNDH-3?

Não recordo quantos dias faz que li ou ouvi críticas intensas - a ponto de se tornarem repetitivas - sobre o 3º Plano Nacional de Direitos Humanos, publicado em 22 de dezembro último no DOU. Mas fixei, pois imediatamente me veio a indignação: 1º – de onde partiam as críticas; 2º – quem noticiava e divulgava as críticas.
Pensei em publicar um comentário no início da semana passada, dizendo que pouco me importava o teor do documento para pontuar os problemas de tais críticas. Mas decidi que, para eliminar qualquer mínima possibilidade de leviandade, deveria antes ler o – extenso – documento. Então, fui lê-lo.
É pouco inteligente assumir um posição radical em relação a ele - exceto se a radicalização vier antes, considerando que o estado, enquanto instituição, não serve à humanidade, posto que é um documento que só existe no âmbito do estado, escrito e defendido por quem hoje dirige a república brasileira. O documento constitui-se de “Eixos Orientadores”, dentro dos quais há “Diretrizes”; ao lê-las, podemos analisar muitas como óbvias, então a priori dispensáveis, outras tantas como mentiras (na costumeira prática de ver algo escrito na lei que jamais é praticado, principalmente quando as ações de cumprimento são de iniciativa do estado), e algumas ousadas, independente do juízo de valor que façamos delas. E são – não exclusivamente – estas últimas que deram forma a tamanhas críticas ao chamado PNDH-3, mesmo que ele seja, na prática cotidiana, na vida da esmagadora maioria dos “cidadãos” brasileiros, pouco significativo, que pouco altera o rumo das coisas – e seria inocente esperar algo diferente.
Mas como é assustador ver que são grandes produtores rurais, os militares e os altos escalões do arquétipo judiciário brasileiro e da igreja católica, todos ganhando voz nas grandes corporações de mídia que se sentem prejudicadas e ofendidas, criticarem o documento – e o porquê das críticas. Parecem considerar que todos os brasileiros são grandes idiotas!!
Grandes produtores rurais querem manter suas práticas odiosas que transformam o uso da terra de meio de produção para campo de especulação; militares que não querem perder ainda mais sua razão de existir, justamente a que dá origem à miséria humana – o mesmo vale para os diferentes envolvidos na estrutura do judiciário brasileiro; grandes conglomerados de mídia desejam manter a manipulação dos fatos, das notícias e da “verdade” - também precariamente abordada no PNDH-3 – de acordo com suas conveniências políticas e comerciais, sem nenhum limite, sem nenhum freio, sem nenhuma vergonha, transformando o conhecimento em mercadoria de alto valor, e que dispensa a reflexão por parte de quem a consome. Por esse motivo, mais uma vez conforme suas conveniências, emissoras de TV em seus noticiários de horário nobre, os “jornalões” mais vendidos e comentados e os típicos radialistas saudosos da ditadura militar (que diziam combater) fazem das suas imagens, linhas e vozes as mesmas de ruralistas, grandes advogados, da cúpula católica... Chegamos ao cúmulo de ouvir o sr. Boris Casoy (aquele que classifica garis como “merda”) alertar a população que as medidas do PNDH-3, de mediação entre governo, sociedade civil, invasores e invadidos, vale também para a zona urbana – não falta muito para virem com a história de que vem aí o comunismo, que vai tomar a casa, o carro, o salário dos cidadãos, e logo, logo, vão voltar os comunistas que devoram criancinhas.
Ou seja, ninguém admite perder um milímetro do espaço que tem. E aí, na miséria da nossa organização social, pode mais quem mais grita. E quem podia abrir os olhos de quem parece ter esquecido de gritar, preocupando-se com o que mais repercute mas o que menos importante há na luta para modificar o estado de coisas.

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