De Alberto Caieiro, "em Pessoa":

"Pensar incomoda como andar na chuva
Quando o vento cresce e parece que chove mais"

15/05/2011

O SINDICATO QUE TEM UM DONO

Sou professor da rede municipal de São Paulo. Não por conveniência (ou não SÓ por conveniência...) Estou cansado de ouvir outras pessoas dizerem que eu deveria fazer outra coisa da vida... Não me incomoda, não me irrita, não acho ruim, mas me canso porque percebo, em muitas das que fazem tal comentário, que ele vem num tom de desprezo pela atividade.
Eu sou e quero ser professor! E é dentre os professores que deveriam estar os melhores. Não sou cego nem sonhador, não alimento ilusões, mas essa é uma questão óbvia para quem tem, antes de mais nada, honestidade ao analisar o que significa trabalhar na educação pública.
Tenho, sim, receio de até quando vou aguentar (fisicamente); tenho, sim, explosões íntimas que colocam em xeque quanto eu trabalho x quanto eu ganho e o que minha família tem e pode ter com isso; tenho, sim, desilusões e decepções e uma sensação de inutilidade, do constante semear no deserto, mas obviamente que nada é tão simples assim, e além disso não há nenhum outro lugar onde eu possa ver uma mudança tão ampla, bonita e preponderante acontecer. Ela vai acontecer. É inevitável. E por razões muito lógicas, objetivas. Neste sentido, o que tem de menos cartesiano e mais fora da razão é minha esperança de estar participando de tal mudança. Não sei se terei tempo suficiente.
Falo de tudo isso porque vejo a escola pública como uma instituição com uma meta clara, inerente à sua existência, que ninguém pode negar, e mesmo que vivam tentando imputar-lhe outras funções e atribuir-lhe outras características, todas elas tornam-se somente adicionais. O problema é que, infelizmente, há muita gente que usa a escola pública para tudo o que permite a sua modesta amplitude de visão - que não ultrapassa poucos milímetros em torno do umbigo; oportunistas sem fim, independente dos diferentes interesses, sejam puramente materiais (é, professor na nossa rede ganha muito mal - o que é diferente de ganhar pouco -, mas ainda assim temos entre nós alguns miseráveis que vivem atormentando em troca de avaras migalhinhas a mais!!!), pessoais (viver na folga ou de gloríolas ridículas e sem cabimento), políticas (muita gente de fora da escola usa a escola para isso, mas também tem gente de dentro...) e, finalmente cheguei lá, sindicais.
O Sindicatos dos Profissionais em Educação no Muncípio de São Paulo, o SINPEEM, é um dos maiores sindicatos do país; fundado há duas décadas atrás, parcialmente como fruto de um intenso movimento grevista durante a administração Jânio Quadros, arrecada um montante em contribuição sindical nada desprezível. Possibilita uma projeção imensa a quem o dirige, evidentemente que em parte por conta do crescimento apresentado nestas duas décadas, mas muito mais pelo setor de trabalhadores em que atua: supostamente, formadores de opinião. Mas aí é que está, como se dizia antigamente, o "busílis" da questão: com tantos profissionais dentro da educação pública e indiferente com seus caminhos, com o eterno "não tem mais jeito" ou "não posso fazer nada" nos lábios, o que é que poderíamos esperar??
Ontem, 14 de maio, este sindicato divulgou o resultado das eleições para a formação de sua diretoria. Foi reeleito, pela OITAVA vez, o atual presidente, com mais de 50% dos votos, numa expressiva participação da categoria (quase 30 mil votantes, embora seja necessário lembrar que houve dispensa de ponto para os eleitores!!) Ele, que é vereador eleito por um partido que compõe a base de apoio do prefeito em troca de meia-dúzia de cargos (apesar de viver em arrotando "independência"), é o eterno presidente do sindicato. Não vou emitir rigorosamente nenhum juízo de valor a respeito de sua atuação como presidente do SINPEEM - até porque não é possível fazer comparações, pois somente ele foi presidente -, mas simplesmente tenho que dizer quão ABSURDO É MANTER UMA PESSOA NO COMANDO DE UMA ORGANIZAÇÃO SINDICAL POR TODA SUA EXISTÊNCIA; ainda que a inexistente possibilidade de vê-lo perder uma eleição para a diretoria se concretizasse, uma nova diretoria ver-se-ia imobilizada, incapaz de realizar qualquer trabalho, porque é evidente que a estrutura se apresentaria completamente viciada. O sindicato personalizou-se, ganhou o carimbo do seu eterno presidente e, por conta disso e da atuação político-partidária que esta pessoa tem, INSTITUCIONALIZOU-SE, tornou-se, na contra-mão de sua razão de ser, uma instituição que representa a administração pública junto aos profissionais em educação!!
Acontece que a categoria, e neste caso podemos simplificar e dizer que a maioria dela, concorda em manter para sempre a mesma pessoa presidindo seu sindicato! Talvez pela disseminação da indiferença, ou pela preguiça intelectual, ou por um pouco das duas coisas... Mas o problema é que, com isso, a categoria deixa de ter um sindicato. Ele virou propridade do seu presidente.
O SINPEEM virou um sindicato que tem um dono.

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